Entrevista Glória Teixeira
Qual a contribuição da epidemiologia no enfrentamento da dengue?
Nós podemos identificar os lugares de maior risco. Todas as epidemias de dengue têm um epicentro. Se nós pudermos fazer isso em tempo real, ou seja, localizar a distribuição dos casos no tempo e no espaço, será possível verificar se as ações de combate vetorial nestes locais podem ser mais efetivas. Sabemos das dificuldades que os serviços de saúde têm para combater focos em todas as casas, em municípios do tamanho de Salvador, ou do Rio de Janeiro. Há dificuldades operacionais imensas para visitar 100% dos municípios, relacionadas à violência, à qualidade do trabalho desenvolvido ou à falta de supervisão. Se pudéssemos nos direcionar aos epicentros das epidemias, talvez tivéssemos mais resultados. Na Bahia, estamos desenvolvendo um trabalho chamado Dengue na Web (www.denguenaweb.org.br), site em que as pessoas podem se cadastrar e notificar onde há casos da doença. As informações aparecem imediatamente no site e permitem fazer uma distribuição dos casos. Esse é um trabalho que dará resultados provavelmente daqui a um ano.
O que já se pode dizer sobre a dengue em 2012?
Esperamos em 2012 a entrada do sorotipo Den4, que já está circulando em seis ou sete unidades federadas e já apareceu em mais de 70 municípios no Brasil. A população brasileira está toda suscetível ao Den4, porque ele praticamente não circulou no país. Além disso, o Den1 está reemergindo; no início da década de 2000, os sorotipos Den1 e o Den2 desapareceram e deram lugar ao Den3. Em 2007 e 2008, o Den2 voltou. Agora o Den2 está diminuindo e ressurgindo o Den1. Isso significa que as crianças que nasceram nesta última década não tiveram contato com este sorotipo e, portanto, são suscetíveis a ele. Há várias indicações de que nós vamos continuar tendo epidemias de dengue. É um desafio para a saúde pública do mundo inteiro, especialmente no Brasil. Nós temos um território muito grande e quase 4 mil municípios infestados pelo mosquito transmissor, o Aedes aegypt.
Há alguma característica específica da dengue no Brasil?
Na década de 1990, havia uma característica bem marcante: a baixa proporção de casos graves. Isso mudou a partir de 2001 e 2002. A gravidade da doença cresceu, principalmente nos últimos três anos. Além disso, mudou a faixa etária. Ao invés de atingir mais os adultos, como foi até 2006, está atingindo agora mais as crianças, particularmente entre cinco e nove anos. Elas estão pagando um tributo muito alto, com uma taxa de óbitos bem mais elevada do que nos adultos.
Quais são as novidades sobre uma possível vacina?
Há várias vacinas no portfólio. A que está mais adiantada está em fase 3. Se tudo correr bem nesta fase, ela estará disponível para a população em 2015 ou 2016. Mas é uma vacina que exige três doses, com um intervalo de seis meses entre elas. Ou seja: Para se adquirir imunidade, demora um ano e meio. Isso significa que não dá para fazer bloqueio de epidemias, como fazemos com sarampo, difteria e meningite. Além disso, nós não vamos dispor, pelo menos nos primeiros anos, de um número de doses suficiente para imunizar a população como um todo. Vamos ter que dispor de toda a nossa capacidade epidemiológica para analisar cada cidade e ver como utilizar de uma forma mais efetiva o quantitativo de vacinas que estiver disponível. Neste momento, ainda não sabemos qual vai ser o seu custo.
* Glória Teixeira é pesquisadora do Instituto de Saúde Coletiva (ISC) da Universidade Federal da Bahia (Ufba)
Autor:
Adriano De Lavor e Elisa Batalha
fonte: RADIS nº 114 Fev/2012 P.17
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